Uma audiência conjunta entre as comissões de Segurança Pública (CSP), Assuntos Sociais (CAS), de Direitos Humanos (CDH) e de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado discutiu, em maio, a obrigatoriedade da presença de profissionais de segurança na porta da escola para prevenir a violência. O debate partiu do Projeto de Lei 2.775/2022, do senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR), da base de apoio do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), e que incluiu, além dos policiais nas unidades escolares, a exigência da instalação de detectores de metal.
O presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Heleno Araújo, destaca que a presença de um profissional da segurança na porta dos estabelecimentos de ensino é um desserviço.
“Quem deve estar neste lugar é um trabalhador/a da educação, especializado na área, concursado, com piso salarial, em conformidade com o inciso VIII do artigo 206 da Constituição Federal e inserido nas diretrizes nacionais de carreira da nossa categoria. Também não concordamos com a instalação de detectores de metal nos estabelecimentos de ensino, isto já foi feito nos Estados Unidos e não reduziu os ataques às escolas”, apontou o dirigente.
Foco equivocado
De acordo com uma pesquisa publicada em 2019 na revista científica Journal of Adolescent Health, que revisou 179 episódios de tiroteios em escolas americanas entre 1999 e 2018, manter guardas armados na escola não reduziu o número de vítimas em massacres.
Para piorar, uma análise do Instituto Nacional de Justiça dos EUA, publicado em 2021, destacou que o número de mortes em escolas com guardas armados tendia a ser quase três vezes maior do que naquelas sem seguranças armados.
Ex-policial militar e Coordenador Estadual da Setorial de Segurança Pública do PT/SP, Leandro Prior, aponta que as iniciativas de colocar profissionais armados nas portas das escolas falham porque a prevenção ocorre por meio de ações investigativas para prevenir ações de violência.
“O policial militar (PM) não tem a missão constitucional preventiva, isso cabe ao policial civil. É uma resposta imediatista, teatral, que visa mais a parte eleitoreira do que a segurança em si. Vai trabalhar mais a sensação do que a segurança. Segurança efetiva é com ações de inteligência”, avalia.
É preciso investimento
Para a CNTE, um pacote de medidas efetivamente eficaz inclui a canais para denúncias de possíveis agressores e a constituição de equipes com a presença de profissionais da área de segurança, da educação, familiares e estudantes para identificar potenciais alunos e alunas com comportamento potencialmente violento.
Além disso, defende a Confederação, é necessário investir na presença de psicólogos para acompanhar as relações escolares e impedir que aproveitadores tentem emplacar propostas que possam ampliar o problema.
O que anda acontecendo por aí
Em abril, o ministro da Justiça e Segurança Pública (MJSP) Flávio Dino anunciou a liberação de R$150 milhões para ampliar a atuação das rondas escolares.
No mesmo mês, o governador de Santa Catarina, Jorginho Mello (PL), afirmou que todas as escolas estaduais terão ao menos um policial armado até junho. Em São Paulo, o deputado estadual da base do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), Guto Zacarias (União Brasil), apresentou um projeto de Lei que autoriza policiais militares de folga a atuarem como seguranças armados em escolas paulistas de forma remunerada.
Outras versões
Reportagem da BBC sobre o tema indicou que, segundo o jornal estadunidense Washington Post, nos Estados Unidos, desde 1999, quando dois estudantes atiraram contra colegas na Columbine High School, um marco para a tendência de violência escolar no país e no mundo, ocorreram ao menos 377 ataques no país.
Em 2021, as unidades educacionais americanas investiram U$ 3,1 bilhões com sistemas e serviços de vigilância e proteção, aponta a consultoria de mercado tecnológico OMDIA. Dados do Centro Nacional de Estatísticas da Educação do governo do país também destacaram que entre 2017 e 2018, apenas metade das escolas tinha controle total do acesso às dependências. Enquanto em 2023, a taxa de monitoramento via câmeras alcança quase 100% delas.
Além disso, 43% das escolas públicas daquele país possuem o chamado "botão de pânico", 78% dos colégios têm salas equipadas com fechaduras capazes de permitir trancamento interno e 65% têm funcionários exclusivamente dedicados à segurança.
Apesar do investimento bilionário e crescente em ações de segurança, 2022 foi um dos anos com maior número de ataques, 47 ao todo.
Falta de efetivo e respeito
Prior ressalta ainda outros problemas, como a falta de efetivo policial para dar conta da função e demonstra preocupação com a maneira de abordar os jovens durante a identificação de algum objeto de metal pelos detectores.
“Quem irá revistar os alunos ou alunas? Teremos policiais femininas suficientes para revistar as estudantes? A tendência é que o detector se torne mais uma maneira de impor humilhação para quem já sofre com questões discriminatórias por conta de classe social, aspectos raciais e de orientação sexual”, pontua.