A pressão da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Educação (CNTE) e sindicatos filiados fez com que a votação do Projeto de Lei (PL) 3776/2008, que institui o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) como índice de reajuste do Piso Nacional do Magistério, fosse retirado da pauta de votação desta quarta-feira (30). O PL estava ‘engavetado’ desde que foi apresentado e voltou à discussão após a aprovação do novo Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) na Câmara dos Deputados.
O secretário de Administração e Finanças da CUT, Ariovaldo de Camargo, afirma que o projeto, na verdade, propõe um congelamento de salários de professores e educadores, indo na contramão do que estabeleceu o Fundeb quando foi criado.
“Ainda no governo Lula, aprovamos uma legislação com uma perspectiva de valorização profissional e para que o financiamento da educação fosse fixado na Constituição. E construímos com isso uma política de valorização profissional do magistério, por meio da Lei do Piso, que foi contestada por vários estados e municípios”, explica Ariovaldo, que também é professor ligado à Apeoesp, o Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo.
Na avaliação de Ariovaldo, o novo Fundeb vai permitir avanços na luta pela valorização do piso nacional porque, “entre outras coisas, o projeto aumenta de 10% para 23% a participação do Governo Federal nos investimentos”. Assim, os novos patamares de investimento servirão como complementação para estados e municípios que não têm recursos e condições de atender o valor nominal do piso salarial.
Mas, por outro lado, Ariovaldo afirma que “a visão dos estados e municípios é de sempre estabelecer aquilo que é mínimo como se fosse máximo”.
Ele avalia que se o PL for aprovado, em boa parte dos estados e municípios haveria um padrão salarial praticamente congelado sendo reajustado somente pelo INPC. “Certamente será um prejuízo muito grande na política de valorização que estamos desenvolvendo”, diz Ariovaldo.
Lei do Piso X PL 3776
A Lei 11.738/2008 tem a função de fixar a correção do valor do piso salarial nacional da categoria e efetivar a jornada de trabalho do professor, fixando em 2/3 da carga horária para atividades em sala de aula, com alunos, e 1/3 da jornada usada para formação e capacitação.
A Lei do Piso também estabelece que o reajuste dos salários dos docentes acompanhe os cálculos do custo aluno/qualidade que orienta a distribuição dos recursos do Fundeb.
Um dos propósitos do custo aluno/qualidade é acabar com disparidades entre as regiões brasileiras e fazer com que sejam garantidos por lei os custos mínimos para garantir a educação de qualidade para qualquer aluno matriculado no Brasil.
A distribuição do valor do Fundeb para o número de matrículas da educação básica, conforme explica Ariovaldo de Camargo, faz com que o valor do piso salarial profissional nacional sempre seja superior a inflação do ano. No entanto, ao mesmo tempo em que foi criada a lei, foi também apresentado o projeto para reajuste pelo INPC.
A proposta estava parada desde que foi apresentada. Na semana passada, o governo de Jair Bolsonaro (ex-PSL) tentou ‘empurrar’ uma emenda ao relatório do novo Fundeb, que determinava o reajuste pela inflação, aos moldes desse projeto. “Tentaram enfiar essa matéria como sendo um indexador do valor do piso salarial, mas como não conseguiram, eles recuperam esse debate para fazer confusão novamente com o tema”, diz Ariovaldo, explicando a razão de o PL ter voltado à pauta.
“O projeto estava ‘dormindo’ há 12 anos e agora, depois da aprovação do novo Fundeb, com a pressão de prefeitos e governadores, o projeto volta à discussão”, ele conclui.
Pressão dos dois lados
Segundo Ariovaldo de Camargo, há uma pressão muito grande de estados e municípios para destruir a política do piso salarial nacional. Ele conta que, por outro lado, a luta da CUT, CNTE e sindicatos filiados conseguiu, na terça-feira (29), fazer com que a Câmara retirasse a votação da pauta desta quarta. Assim, o projeto só voltará a ser analisado na próxima semana.
“Os prefeitos e governadores certamente vão continuar fazendo pressão para que o PL seja votado, mas nós faremos pressão para que ele não seja aprovado e nem votado no Congresso”.
Ariovaldo alerta que os educadores têm que estar atentos à mobilização por este tema porque é “crucial para uma política de valorização profissional nos próximos anos”.
Paralelamente, a pressão para que o novo Fundeb seja aprovado também no Senado continua. “Conseguimos aprovar na Câmara e agora estamos pressionando para que o Senado vote também nos mesmos moldes em que foi votado na semana passada.”
Brasil e os piores salários para professores
A última pesquisa da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), intitulada Education at a Glance, coloca o Brasil na última posição no ranking salarial do magistério entre as 40 nações e blocos regionais analisados.
Em 2019, a média salarial do magistério na OCDE, em início de carreira, foi de US$ 34.943,00, enquanto na Europa foi de US$ 33.871,00, na Alemanha US$ 63.866,00 e em Luxemburgo US$ 79.551,00. No Brasil, nesse mesmo período, a média salarial anual de nossos professores foi de US$ 13.971,00.
“Nós ocupamos a vergonhosa posição de último lugar em remuneração média dos professores e profissionais da educação, portanto temos muita coisa ainda para avançar na valorização profissional”, diz Ariovaldo.
O secretário de Administração e Finanças da CUT lamenta que até agora ainda não se tenha conseguido avançar muito no Plano Nacional de Educação (PNE), que estabelece metas, como a Meta 17, que prevê a completa aplicação da Lei do Piso até o fim dos primeiros seis anos da vigência do plano, que começou em 2014 e vai até 2024, por tanto, o prazo é 2020.
“Para este ano estava previsto que o piso salarial dos professores não seria inferior à média das remunerações de trabalhadores com formação superior, portanto estamos falando de uma lei nacional - um piso - que deveria atingir esses patamares, mas estamos muito distantes ainda desse referencial”, ele afirma.
De acordo com ele, um dos obstáculos é a Emenda Constitucional (EC) 95, que congelou os gastos públicos por 20 anos. “É um impeditivo para podermos atingir a Meta 17 do PNE, que vem dos burocratas e do governo federal que não têm compromisso com a educação”.
Fonte: CUT Nacional