No último dia 15, durante o Fórum Social Mundial, em Salvador-BA, a CNTE se juntou a outros representantes da educação pública para debater o assunto na perspectiva de barrar os retrocessos decorrentes dessa investida neoliberal, em um Seminário promovido conjuntamente pela Internacional da Educação (IE) e Internacional da Educação para América Latina (IEAL).
Além da CNTE, representada pelo seu Presidente, Heleno Araújo; pelo Secretário de Relações Internacionais e Vice Presidente da Internacional da Educação, Roberto Leão e pela Secretária Geral e Vice Presidente da Internacional da Educação para América Latina, Fátima Silva, foram debatedores Mar Candela (IE - Bélgica), Combertty Rodriguez (IEAL - Costa Rica), Jose Olivera (FENAPES - Uruguai), Miguel Duhalde (CTERA - Argentina), Nilton Brandão (PROIFES - Brasil) e, vindo do Quênia, Wilson Sossion, Secretário Geral do Sindicato Nacional de Professores daquele país (KNUT).
Fátima Silva abriu os trabalhos destacando a pesquisa global que a Internacional da Educação está conduzindo sobre a privatização e mercantilização do ensino público, intitulada “Educar, Não Lucrar”. “Tão importante quanto entender os impactos da privatização é ter claro as estratégias que devemos adotar para enfrentá-la. Nós, da CNTE e da Internacional da Educação, já compreendemos claramente que as ações devem ser globais e não por países, ou por entidades isoladas. Sozinhos não chegaremos a interromper esse processo”, disse.
Mar Candela é Coordenadora do Projeto de Resposta Mundial à Privatização e ao Comércio Educativo da Internacional da Educação, e os dados que apresenta demonstram a gravidade do tema. “Nos últimos cinco anos aumentaram em 45% os investimentos de capital de risco em empresas do setor de educação. Esses setores articulam uma narrativa que fala da superioridade da educação privada frente à educação pública, como se as escolas privadas tivessem maior eficiência e melhores resultados nos processos educativos, o que não está respaldado pelas evidências”, revela.
O coordenador do escritório regional da IEAL, Combertty Rodriguez, alertou para a aliança público-privada que os grandes grupos que investem nesse setor propõem: o setor público coloca os recursos, e o privado lucra! Ou seja, a influência cada vez maior que esses conglomerados exerce nos espaços de elaboração de políticas educativas altera a relação do Estado com o setor de educação, ameaçando até mesmo o futuro da democracia.
O Presidente da CNTE, Heleno Araújo, reforça essa ideia, pois considera que o ataque à democracia brasileira é uma tentativa de entregar as políticas públicas para o setor privado. “O desafio nessa disputa de projeto de sociedade, sentimos na pele, aqui no Brasil. Nos governos Lula e Dilma houve a efetiva participação social na construção de políticas sociais e, agora, o golpe desmonta isso.”. Heleno destacou, ainda, que “a aplicação do modelo de gestão privada nas escolas públicas precisa ser combatido por todas as entidades que devem disputar esse projeto em cada estado e fortalecer a CONAPE (Conferência Nacional Popular de Educação)”, concluiu.
O representante do Uruguai, Jose Olivera, destacou a tradição do seu país em valorizar a educação pública como construtora de cidadania e democracia. Lembrou que 84% dos estudantes uruguaios hoje estão em sistemas públicos e estatais. “Nos últimos anos enfrentamos uma campanha contra a educação pública, que colocava o ensino público como ruim e obsoleto, e o privado como muito superior”, afirmou Olivera, que apontou o caminho para enfrentar esse movimento: “o primeiro passo é a ação política; o segundo, é gerar pesquisas, unindo academia e sindicatos”.
Os dados trazidos da Argentina por Miguel Duhalde, da CTERA, indicam que de 1940 até os dias atuais, houve um salto de 7% para 30% dos estudantes em escolas particulares. “Nos anos 90 a tendência privatizante avançou e, hoje, está em disputa um modelo e projeto de educação. A palavra direito está desaparecendo do léxico legal e dos direitos sociais na Argentina, e este é um movimento que temos que contrapor”.
Em sua fala, Nilton Brandão, presidente do PROIFES-Federação, ressaltou os avanços no ensino público brasileiro, o aumento de alunos nas universidades e a interiorização do ensino superior no país por meio da criação de Instituições Federais de Ensino Superior. “Mas, os dados destacados pelo PROIFES-Federação em diversos encontros da IEAL, mostram que o avanço privatista foi significativo a partir de 2013, e as entidades privadas de educação, com investimento em bolsa e ações em vários países, foram os grandes beneficiados desse avanço. Com a Emenda à Constituição 95, não há como ter investimentos em educação e manter o mínimo de avanços sociais conquistados ao longo das últimas décadas”, destacou Brandão.
Para todos os que estiveram presentes no Seminário, foi muito enriquecedor ouvir o representante do Quênia, que compartilhou a experiência daquele país sobre o tema. Wilson Sossion lembrou que a privatização da educação em seu país conta com o apoio do Banco Mundial e do Fundo Mundial Internacional (FMI), que incentivam a presença de grandes conglomerados educacionais no Quênia.
“Em 2009 um grupo apoiado pelo Banco Mundial e por muitos conglomerados se estabeleceu silenciosamente no Quênia. Em um curto período de tempo criaram 470 escolas e pretendem ter pelo menos outras mil até 2025”, afirmou, destacando que as leis sobre educação pública no país são claras, mas que as autoridades que fiscalizam têm cedido ao poder econômico. “Hoje ainda podemos barrar a privatização, mas se não agirmos rapidamente com ações eloquentes, em pouco tempo isso não será mais possível”, alertou Sossion.
A CNTE luta para que os recursos públicos sejam destinados somente para a educação pública e faz o enfrentamento ao processo de mercantilização da educação no Brasil. Juntamente com as demais entidades brasileiras filiadas à IE (Internacional da Educação), traça estratégias para confrontar a crescente privatização e fortalecer a educação pública de qualidade.