Na tarde desta terça-feira (20), deu-se continuidade ao Seminário Nacional “Privatização e Mercantilização da Educação no Brasil”, que segue nesta quarta-feira (21). Mais duas pesquisas foram apresentadas, uma encomendada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) à Universidade de Brasília (UnB) e outra realizada pela Federação de Sindicatos de Professores e Professoras de Instituições Federais de Ensino Superior e de Ensino Básico Técnico e Tecnológico (Proifes).
A primeira – “Privatização e Mercantilização da Educação Básica no Brasil: Análise das matrículas, orçamentos públicos, transferências de recursos públicos à iniciativa privada, políticas de renúncia e isenção fiscal e a percepção dos dirigentes sindicais sobre as políticas de privatização em curso no Brasil” – foi apresentada pelos pesquisadores da UnB Evilásio Salvador e Natália Duarte.
Segundo Evilásio, coordenador do trabalho, um dos elementos importantes percebidos no estudo é a renúncia tributária. “Há uma verdadeira regressividade na transferência dos recursos da educação. O Estado abre mão da arrecadação de impostos que poderiam financiar uma educação pública de qualidade. E esses impostos de que abre mão servem de dedução para os setores de maior poder aquisitivo na sociedade para financiar a educação privada para os seus filhos. Isso funciona verdadeiramente como uma bolsa privada por meio de renúncias tributárias que saem do fundo público”, explicou o pesquisador. Segundo ele, esses valores são muitas vezes maiores do que, por exemplo, o que o governo gasta com o programa Bolsa Família, que alcança milhares de estudantes na educação pública brasileira.
A pesquisa consta de quatro relatórios que identificam o andamento da privatização e mercantilização da educação básica. O primeiro mostra o avanço das matrículas privadas na educação básica no país a partir de dados de estados e municípios. O segundo, dividido em duas partes, trata da apropriação do fundo público dos orçamentos estaduais e municipais por parte do setor privado da educação. Uma terceira parte comprova o avanço das renúncias tributárias nos últimos anos a partir do orçamento da União e que contribui para a privatização e mercantilização da educação básica. Por fim, há uma parte qualitativa, feita com dirigentes sindicais, para discutir a percepção sobre esse movimento.
Apesar de realizada há dois anos, a pesquisa já apontava para um avanço da privatização da educação básica. A conjuntura e o cenário político do país mudaram consideravelmente nesse período e há um ataque aos direitos dos trabalhadores. “A educação parecia uma última fronteira blindada ao ataque do capital, mas isso ocorre em uma ofensiva de vários grupos privados mundialmente e que também atuam no Brasil no sentido de se apropriar da educação pública. O que a pesquisa traz são vários elementos para fortalecer a luta sindical, fazer uma contra ofensiva a essa reação de privatização e mercantilização. Se os movimentos sindicais e a comunidade acadêmica e escolar não se mobilizarem em defesa da educação pública de qualidade, esse cenário pode se tornar irreversível”, alerta Evilásio.
Conferência da Educação
No seminário, foi lançada oficialmente a Conferência Nacional Popular da Educação (Conape). No início deste mês, a CNTE e várias entidades que representam a educação anunciaram a sua saída do Fórum Nacional de Educação (FNE) após a Portaria nº 577/17 e o Decreto de 27 de abril de 2017, impostos pelo governo federal e que estabelecem, de forma arbitrária, nova composição do Fórum. Com isso, a Confederação e outras entidades anunciaram a constituição do Fórum Nacional Popular de Educação e a construção da Conferência Nacional Popular de Educação (Conape).
Segundo o presidente da CNTE, Heleno Araújo, a Conape é uma conferência de mobilização social. “Esse governo golpista, ilegítimo e corrupto quer evitar a participação social. Eles estão desmontando toda a estrutura de conferências, não só da educação, para evitar que as pessoas tenham a oportunidade de participar e apontar os caminhos necessários para as políticas públicas. E nós da educação nunca nos entregamos a isso, nem na ditadura militar, nem no processo da Constituinte, e não vamos nos entregar agora. Por isso, a Conape é importante para continuar mobilizando nos municípios, nos estados, e vamos realizar a nacional para pressionar todos os governos pela implementação dos planos de educação”, garantiu Heleno.
Ensino superior
O diretor de Relações Internacionais e Políticas Educacionais do Proifes, Gil Vicente Reis de Figueiredo, apresentou o trabalho “Privatização do Ensino Superior Público”. A pesquisa mostra o que, historicamente, desde o início deste século, tem acontecido com a transferência de recursos públicos para o setor privado da educação, o que, em suas palavras, “tem sido um descalabro, um absurdo”. O estudo também responde o que tem a ver a Emenda Constitucional nº 95, que limita o teto dos gastos públicos, com as universidades e os institutos federais. “Não tem espaço para as áreas sociais, como a educação, sobreviverem com essa emenda. Ela, na verdade, socializa o prejuízo”, avisou Gil.
O diretor do Proifes utiliza o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) como exemplo. “No fim do governo Lula, R$ 1 bilhão era emitido todos os anos. No fim do governo Dilma, R$ 20 bilhões. E, neste ano, segundo o ministro da Educação, temos R$ 32 bilhões, quando o orçamento do Ministério da Educação não chega a R$ 100 bilhões. Então, R$ 32 bilhões são destinados à indústria privada da educação transformar esses recursos em dinheiro para os acionistas”, concluiu.